Mosteiro dos Jerónimos

Em finais do século XV, Belém ficava a umas horas de Lisboa. Outros tempos, não existiam carros ou estradas alcatroadas. Havia pernas, carroças e estradas romanas. A praia de Belém tinha apenas uma pequena aldeia de pescadores. Talvez pela sua localização geográfica, por ser perto do mar, foi aqui que o Infante D. Henrique (1394-1460), o grande impulsionador da expansão marítima portuguesa, mandou construir a pequena Ermida de Santa Maria de Belém. Era aqui que os navegadores faziam as suas orações antes de se fazerem ao mar.

 

As viagens e o comércio marítimo fizeram a área crescer. Décadas mais tarde, foi também aqui que D. Manuel I (1469-1521) mandou construir o Mosteiro de Santa Maria de Belém, hoje conhecido como Mosteiro dos Jerónimos porque o Rei o entregou aos frades da ordem de São Jerónimo. Assim se explica o nome.

História da colonização portuguesa do Brasil / dir. e coord. lit. Carlos Malheiro Dias ; dir. cartográfica Ernesto de Vasconcelos ; dir. artística Roque Gameiro. Porto: Litografia Nacional, 1921-1924 

Uma curiosidade sobre este facto, esta ordem religiosa estava tradicionalmente ligada à monarquia castelhana. Dizem que D. Manuel a escolheu porque tinha em mente que o seu casamento facilitasse a unificação da Península Ibérica, em seu favor, claro. Sim, bem sabemos que parece estranho, mas naquela época, mais do que ligações amorosas, os casamentos reais firmavam alianças político-diplomáticas. E, na verdade, este rei casou-se com a herdeira do trono de Castela e Aragão, de quem teve um filho, que seria o herdeiro da coroa de Portugal, de Castela e de Aragão. Os planos sairam furados, a rainha morreu durante o parto e o príncipe herdeiro dois anos mais tarde, adiando assim a União Ibérica.

Os cronistas antigos defendiam que o Mosteiro foi mandado construir por D. Manuel I como forma de agradecimento pelo descobrimento do caminho marítimo para a Índia. Historiadores mais recentes contrariam esta teoria com base na cronologia: o plano de construção do Mosteiro (1496) e respetiva autorização papal (1497), são anteriores à chegada à Índia por via marítima (1498).

Posto isto, não é mentira que a construção dos dois mais importantes monumentos nacionais quinhentistas, o Mosteiro dos Jerónimos e a Torre de Belém, foi financiada com os lucros do comércio da pimenta da Índia.

É, D. Manuel I, que nem era pretendente direto ao trono, conseguiu o jackpot. Herdou a coroa por nomeação do seu primo, D. João II, que não tinha descendentes legítimos diretos. Foi durante o seu reinado que se descobriu o caminho marítimo para a Índia (1498) e assim se estreou a Carreira da Índia, uma rota comercial muitíssimo lucrativa. Por mero engano de percurso, foi também neste período que se chegou ao Brasil (1500), território que até então, a Europa desconhecia a existência. Daí o seu cognome, o Venturoso, que é como quem diz, aquele que teve uma sorte do cacete!

 

A construção dos Jerónimos só começou efetivamente em 1502. Teve mão de diferentes mestres, demorou várias décadas e já foi alvo de várias reabilitações. Expoente máximo da arquitetura Manuelina, cruza elementos do gótico final, a altura da igreja-salão, por exemplo; renascentistas, a simetria e horizontalidade do claustro; e de simbologia régia, cristã e naturalistas. Consegues identificá-los? Quantas esferas armilares, escudos reais, cruzes de cristo, conchas, cordas retorcidas, e por aí adiante, encontras?

O terramoto de 1755 não causou grandes estragos na zona de Belém. Apesar da altura da Igreja, no seu conjunto, o Mosteiro sofreu apenas alguns danos nos dormitórios do Mosteiro. Tem que ver com a qualidade do solo. Se/quando houver um novo terramoto em Lisboa, já sabes para onde fugir. Se houver um tsunami, garante só que estás no lado certo da linha do comboio.

 

Com a extinção das ordens religiosas em Portugal, em 1834, o Mosteiro foi entregue à Real Casa Pia, instituição social destinada à educação de órfãos. Aqui viveram mais de 1000 crianças e jovens. Bem, detalhe da orfandade à parte, já imaginaste, poderes dizer que viveste no Mosteiros dos Jerónimos?

 

Diz-se por aí que foi nesta altura que surgiram os famosos pastéis de Belém. Expulsos os frades, aqueles que trabalhavam no Mosteiro tiveram de procurar novo sustento. Alguém se pôs a vender pastéis na rua e, pelos vistos, ganharam fama. Segundo o site dos Pastéis de Belém, ainda hoje a receita é a mesma. Que são bons, ninguém o nega. Mas já experimentaste os da Manteigaria? Porta quase em frente, na esquina, sem filas e diz a minha mãezinha que são bem melhores. 😆

O Mosteiro foi alvo de obras de reabilitação em finais do século XIX. Houve um “pequeno” percalço. Alguém achou boa ideia confiar as obras a dois cenógrafos do Teatro de São Carlos que, claramente, tinham poucos conhecimentos de engenharia. Faziam planos de fazer uma torre com um relógio, mas, em vez disso, desmoronou a torre central.

© Arquivo Municipal de Lisboa | PT-AMLSB-CMLSBAH-PCSP-004-SEX-000410

© Arquivo Municipal de Lisboa | PT-AMLSB-POR-13-122; Página 22V

Outro detalhe curioso, os edifícios a poente do Mosteiro, onde hoje estão sediados o Museu Nacional de Arqueologia e parte do Museu de Marinha, foram construídos nesta fase. São, portanto, de arquitetura neomanuelina.

© Arquivo Municipal de Lisboa | PT-AMLSB-CMLSBAH-PCSP-004-SEX-000405

Na última década de 80, foram descobertos uns riscos estranhos numa parede da Igreja. Pensa-se que sejam da época de construção do Mosteiro, feitos pelo próprio mestre. Serviam de molde. O mestre desenhava na pedra, em escala real, as suas ideias para as estruturas arquitetónicas e motivos decorativos, e assim, os construtores tinham uma melhor visão do pretendido.

 

O Mosteiro dos Jerónimos e a Torre de Belém estão classificados como Património Mundial pela UNESCO desde 1983.

Aqui podemos encontar os túmulos de:

    • Luís Vaz de Camões, escritor (c. 1524 – c. 1580)
    • Vasco da Gama, navegador (1469 – 1524)
    • Rei D. Manuel I (1469 – 1521) e mulher, D. Maria de Castela (1482 – 1517)
    • Rei D. João III (1502 – c. 1557) e mulher, D. Catarina de Áustria (1507 – 1578)
    • Cardeal Rei D. Henrique (1554 – 1580)
    • Rei D. Sebastião (1512 – 1578), apenas a arca tumular pois o Rei ficou perdido em combate na Batalha de Alcácer Quibir
    • Alexandre Herculano, historiador, escritor e jornalista (1816 – 1877)
    • Fernando Pessoa, escritor (1888 – 1935)

© Arquivo Municipal de Lisboa | PT-AMLSB-CMLSBAH-PCSP-004-PAG-000349

Informações:

Referências:

    • Araújo, N. (1944) Inventário de Lisboa, fascículo 1, CML: Lisboa.
    • Beirão, S. (1944) Monumentos de Lisboa, o Mosteiro dos Jerónimos. Revista Municipal, 18 (24-26)
    • Giorgetti, G. R. (2022). Contributos para a Valorização Patrimonial do Legado de D. Manuel I, nos 500 Anos da sua Morte. Relatório de Estágio no Mosteiro dos Jerónimos e Torre de Belém. Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.
    • Moita, I. (1994) O Livro de Lisboa. Livros Horizonte: Lisboa. (181-194)
    • https://www.patrimoniocultural.gov.pt/pt/museus-e-monumentos/dgpc/m/mosteiro-dos-jeronimos/, consultado a 23 de Julho de 2023.
    • https://observador.pt/factchecks/fact-check-restauro-de-mosteiro-dos-jeronimos-destruido-ocorreu-durante-o-estado-novo/, consultado a 23 de Julho de 2023.
    • https://pt.wikipedia.org/wiki/Mosteiro_dos_Jerónimos, consultado a 23 de Julho de 2023.

Fotografias adicionais:

Capa website:

    • © Arquivo Municipal de Lisboa | PT-AMLSB-POR-05729

Redes sociais:

    • © Arquivo Municipal de Lisboa | PT-AMLSB-CMLSBAH-PCSP-004-KPI-000231